terça-feira, 5 de abril de 2011

para as paredes 008

Minha tia uma vez disse que eu escrevia para o meu primeiro namorado. Ela sabe, mas talvez comigo não tenha percebido, que nós escrevemos para aqueles com quem nunca tivemos nada. Não que nada seja a palavra certa, muito pelo contrário, talvez nada nunca represente - nem passe perto de representar - a proporção das coisas com quem não tivemos "nada", porém é errado acreditar que dediquei muitas das minhas nostalgias àquelas pessoas com quem me relacionei. Escrevi sobre aquilo que vi mas, muito mais que isso, sobre tudo aquilo que sonhei.
Minha tia talvez achasse que eu sentia dor daquilo que vivi; mal sabia ela que o que me doía era exatamente tudo aquilo que deixei de viver, cada palavra não dita, gesto não saboreado, sentimento sonegado. Minha tia entende muito bem que a saudade do que vivemos não machuca tanto quanto o ressentimento daquilo que não nos permitimos viver. Ela sabe, sabe muito bem, sabe assim como eu que o Roberto Carlos que nos toca não é aquele dedicado a nós, mas aquela canção que ficou no lado B dos nossos corações, esperando que o disco fosse virado e ele nunca foi. Ela sabe que o que foi vivido não provoca um vazio tão intenso como aquele espaço que fica quando deixamos de viver.
O que sinto é saudades. Mas não, tia, não é saudades de nada que eu já tenha vivido. É uma saudade vazia, é do que eu encontrava em mim, das histórias que fantasiava, dos sonhos que pensava e os planos que concebia. É uma saudade sem objeto, uma saudade que sempre existiu e sempre existirá, necessária para que o meu coração permaneça batendo. Preciso daquele espaço vazio, daquele espaço saudoso, todos nós precisamos de um pouco de amor reservado a ninguém.
Roberto já dizia que "das lembranças que eu trago na vida, você é a saudade que eu gosto de ter". E a minha saudade é assim: sem cara, sem nome, sem rumo. É a saudade de tudo que eu jamais vou viver.

Nenhum comentário:

Postar um comentário