domingo, 27 de dezembro de 2015

Silêncio

Não sei a quem visitas à noite. Nem o que bebes de manhã. Não pude conhecer teus hábitos. É só teu olhar que ficou em mim. E as músicas que ouvimos juntos passam por mim como fantasmas que gritam cada vez mais alto teu nome. Eu sei, vai ficar tudo bem, é o que Alabama Shakes diz.  Um dia vou te encontrar por acaso cruzando os corredores da faculdade ou em uma festa qualquer de tantas que gostamos de ir, ou quem sabe te encontro solitário, em um sábado de tarde, em um inverno frio, lendo algum livro que provavelmente está na minha estante. Porque somos feitos de coincidências, eu e tu, porque somos feitos de algo que chamo de identidade. Não entendo do nosso encontro, foi mais como um teste para mim. Acho que repito de ano e não aprendo a lição... Sei que não me esperas. Sei que não pensas em mim. Sei que em outros braços estás. Fico feliz. Mesmo. E fico pensando no quão feliz eu teria te feito também, naquele doce mês de agosto.

domingo, 11 de outubro de 2015

Sem mais, nem menos

Tenho a impressão que ele está voltando a ser como era antes. Irritações e momentos de grosserias com motivos estranhos. Ontem vendo TV, eu falei pra ele botar no canal das motos que ele queria ver a corrida. Estava feliz, mesmo com um momento delicado, estávamos ali, juntos, dividindo uma noite qualquer. E aí, abracei ele e disse te amo. Ele não sorriu. Nem me olhou. Estava sério. Compenetrado. No momento não percebi que era o final da corrida. Havia retirado os óculos e tenho forte miopia. Repeti baixinho perto do ouvido dele: "eu disse te amo"; emiti um risinho constrangido de quem tem medo do silêncio. Ai, Márcia, não tá vendo que tá acabando a corrida???? Poxa! 
No mesmo momento tomei uma certa distância no sofá. Fiquei dura, ouvindo aqueles roncos de moto fino de quem corre leve, de quem corre rápido. Mas não enxergava nada. Meus olhos embaçaram muito para ver qualquer coisa, na verdade. As lágrimas caíam com extrema facilidade. Meu peito apertava. Fazia tempos que não ouvia uma grosseria  daquelas dele. Um trauma súbito passou pelo meu corpo todo. Me arrepiando. Me pondo nos meus piores pesadelos. Por que ele estava assim? Seria minha culpa? Não. Não podemos botar a culpa no outro pelos nossos temperamentos tempestivos. Eu não pus, e bem que poderia. Fiquei refletindo nas nossas diferenças em ataques de fúria. Eu pareço louca. Fico indignada. Berro. Causo tumulto. Mas não sou grosseira assim, num momento de carinho, de ternura. Não estou certa, mas não percebo causar mágoas gratuitas. Mas isso, bem, é subjetivo e parcial. Eu reconheço que quanto menos esperneio, mais me fecho dentro da minha casca de indignação. O que incomoda, sei que incomoda ele profundamente. Mas fico me perguntando se ele sofre como eu sofro em momentos assim: de violência sem precedentes. Me pergunto se o peito dele aperta, se ele tem vontade de sumir. 
Não queria que ele me visse chorar. Então deslizei pra um cantinho do sofá e lá fiquei, encolhida, afundada nas minhas mágoas, sabia que o passado me visitava e esquecera de bater na porta. Se ao menos ele quisesse entender como me sinto. Se ao menos conseguisse me enxergar daquela maneira.. tão pequena, tão frágil. Foi aí que ele resmungou: não acredito que vais ficar assim. Agora a corrida acabou. Por que tu não esperou a corrida acabar? E eu, respondi, de maneira até meio estupidamente ingênua, que não tinha visto. E ele, te falta é atenção então. Naquela hora não achava que me faltava atenção. Achava que me faltava carinho, afeto, respeito, dedicação. Foi então que ele disse que eu demandava muito. E fiquei refletindo sobre isso também. Nessas horas a culpa sempre parecia minha. Senti que meu sonho tinha acabado ali. Ele voltara a ser como era antes. Um descuido e uma prepotência que eu jamais vi em ninguém. Já podia sentir falta dos dois meses que convivi com o seu melhor eu. Calmo e justo. Por quem eu tinha me apaixonado à terceira vista. Lembro que no terceiro dia que começava a falar com ele, sentia uma forte pulsão de largar tudo e correr para seus braços e ficar ali, adormecida,  junto de seu perfume e de seu calor para sempre. Foi paixão abrupta, foi devaneio, não foi parecido com nada do que já tinha provado. Era como se eu pudesse me apossar da alma dele, como se pudesse unir meus motivos com os dele com beleza e maestria. E tudo estaria explicado. O universo para mim se resumiria nos caminhos que trilharíamos juntos e isso bastaria. E foi em meios disso que chamo de o começo de nossa história que me perdi, me deixei levar, fugi do que eu conhecia de mim até então. E ontem, minha satisfação se dissipou no ar gelado da madrugada. Depois da tristeza, veio o medo de ele continuar assim. E que para mim, não haveria escolha a não ser me despedir. E dessa vez, para sempre. Mesmo eu, que não acredito em para sempres mais. Sei que não há mentira que repetida não se torne verdade. 

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Por que nós?

Ou por que não?


"fomos serenos num mundo veloz

nunca entendemos então por que nós

só mais ou menos"





Porque nesses dias todas as inquietações se transformam em música.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Flor de manjericão

Acumulei em diversos rascunhos todas as frases de efeito que poderia usar um dia para te escrever. Rabiscados à mão ou digitados na tela, encaro todas as sentenças que já não nos chamam mais. Por que insisto em te evocar? Rompi com minhas próprias regras ao permitir que te enraizasse naquelas músicas tão lindas e longas. Não consegui manter as barreiras de te fazer ser música sem significado algum e que jamais fosse sentir a necessidade de tocar novamente. Hoje elas tocam. São uma fila de músicas que somam mais de muitas horas, que foram ouvidas durante o breve sequestro que ainda relatarei um dia, que marcaram todas as despedidas que já tentamos ter, embora ainda não consiga entender como um abraço possa durar os sete minutos de uma música quase sem fim. Escrevo textos desconexos, frases sem liga, dramas sem sujeito... Todos vazios de não te precisar mais. Ainda me pego pensando o porquê de insistir nesses chamados sem retorno, nas ligações que não faço, nas revistas que compro e endereço erradas propositalmente, para que nunca cheguem às tuas mãos. Ainda me pergunto qual parte de mim não pode morrer quando te deixo à deriva e te abandono aos porões do meu pensamento e te ressuscito para sacudir, odiar e relegar mais uma vez. Ainda me pergunto porque lês minhas angústias com ar de observador, forçadas na ausência de um drama real com que me preocupar. Pergunto-me quanto de massagem no teu grande ego as minhas palavras perdidas podem oferecer. E volto ao fim reticente, ao início que não sei mais onde fica, às esquinas e músicas de sempre. Volto pra te ver passar. Volto pra não esquecer como foi me amar.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Too Late

Era tarde, era tarde na minha vida e tu apareceste. Inebriada já, insensata, talvez, teus olhos que até hoje não sei de que cor eram refletiam ao mesmo tempo meu desespero e minha tranquilidade diante daquela noite, diante daquele bar. Acho que eu não esperava aquilo, talvez, eu não esperasse nada, mesmo. Contei os degraus pensando que me beijarias lá em cima. Às vezes fico pensando se eu leio bem as pessoas ou elas que são tremendamente previsíveis. Mas nem tudo estava previsto, ora, ora... se estivesse, provavelmente não estaria contando e recontando essa noite aqui.
A verdade é que tive muitas noites. Eu conheci muita gente. Não tantas quanto eu gostaria, mas o suficiente pra conseguir mensurar esta em especial. E eu vi tanta, mas tanta beleza e sinceridade no que aconteceu ali. Da minha maneira torta, eu consegui esquecer meu mundo lá fora. Meu passado. Meu futuro. A noite tinha uma dimensão de vida e morte simultaneamente. E cada copo que eu bebia, tinha gosto de liberdade.
Os fantasmas que me atordoavam, calaram. Meu riso se fez largo. Meus pés, te seguiam. E entre abraços e olhares, nos fundíamos ao lugar, à musica, à alegria. Elis era Piaf e cantava alto... e eu? Eu cantava mais alto ainda... A noite se fez dia no calor que nos unia. Eu mal entendia o teu olhar, de quem se surpreendia, de quem se encantava e sorria ao me ver sorrir. Poder encontrar conforto e semelhança em lugares vazios, naquele dia me mostrou mais do que eu podia enxergar, pois quando fui embora, vi que não estava preparada pra ser feliz assim. Eu tinha medo. Existia muita coisa presa aqui fora, na vida real, muitos nós, muitas conversas inacabadas e sentimentos confusos. Existia muito trabalho pra mim pra poder largar tudo e passar a viver assim, de mãos dadas com aquele desconhecido. Mas a ilusão é doce, me vestiu bem naquele momento. E agora, quando fora a hora, eu saberei reconhecer e procurar no lugar certo.

sábado, 15 de agosto de 2015

Me(i)a Culpa

É injusto dizer que de nós dois não restou nada, embora precise fazer força para trazer a tona as evocações que Ana me pede com tanta insistência por não crer na possibilidade que quase tudo tenha desaparecido nesse dilatar dos tempos. É injusto reduzir o que fomos (ou será o que somos?) a esse bloco de notas, ao tocador de músicas que repete sem cansar as faixas na tentativa de rememorar aquele gosto, ao vidro que guardava para lançar contra a luz e reproduzir fielmente a cor dos teus olhos e que já não tenho vontade de olhar.

Dividamos a culpa das injustiças, do afastamento, de todos os nossos desencontros. Assumo minha metade nas tantas vezes que silenciei tua boca com o dedo indicador para impedir teus lábios de pronunciarem um eu te amo. Assumo minha metade no orgulho que me fez imóvel quando deveria ter batido uma vez mais na tua porta - eu sei que estavas atrás dela me ouvindo chamar. Assumo minha metade sem culpa nas vezes em que enlouquecidamente te quis e busquei enquanto insistias para que eu fosse embora.

Peço-te a tua metade e cobro a conta pelos momentos em que olhei pra trás esperando te encontrar me buscando... não encontrei. A tua parte que me cabe nas inconsistências, nas idas e vindas tão frequentes e cronometradas quanto as cheias das marés inspiradas pela lua que se expande e contrai. A tua parte nas músicas que me levaram a loucura e que sei que fizeste de propósito. No passo derradeiro, no alcance da mão, no sequestro anunciado com a música ensurdecedora, me deixaste ir embora todas as vezes, deleitado na certeza de me ver voltar.

É injusto dizer que de nós dois não restou nada. Restou a conta em aberto, somas por acertar, restou o desencontro dos olhos que não se veem nem para equalizar as dívidas. Restou a vontade de te ver cais, de deixar de ser farol e passar, um dia quem sabe, a navegar com a certeza de te encontrar onde sempre foste insegurança. Restou a vontade de fazer o reverso, de em ti encontrar calmaria. Injusto, não?

terça-feira, 21 de julho de 2015

Descaso e Acaso

Ai, o mundo da materialidade! As pessoas se tornaram completamente descartáveis para as outras. E acredito que quando a gente entra nesse paradoxo, a gente reproduz a máquina. Para a maioria das pessoas basta um pouco, sem pedir muito, sem doar-se muito também.
Admiro meu jeito de combater isso. Mas às vezes não sei me colocar em primeiro lugar. Como se os problemas dos outros e a sensibilidade do outro me passasse por cima e eu esquecesse de mim mesma. Não consigo não me importar, não perguntar, apertar um botão de apagar e 'puff''. Tudo virou passado, pó, cinza. Não! Me recuso. Me recuso.
Eu gosto da maneira burra infelizmente de ser, gosto de reativar as coisas, de puxar pelo passado, de ver se aquela plantinha cresceu ou morreu. Simplesmente, também gosto de me ver no outro do passado. Nos traços que deixei no outro. Como um espelho que gravaria nosso eu antigo. Um lado narcisista não quer desaparecer no tempo e no espaço do esquecimento alheio. Porque assim, eu também me esqueceria de quem eu era? Ora, que besteira.
Quem é que precisa ser lembrado de quem é? Todos nós. Que podemos fazer... Por hora nos esquecemos de quem realmente somos. Nossas identidades ficam perdidas no ar. Nossas raízes flutuantes... Engraçado. Acredito que até o não perdoar é uma maneira de nos manter presos no passado, no conhecido. O conhecido é guardar mágoas, é não deixar ir. É querer remoer, querer se perder naquela imensidão de tristezas e decepções de um relacionamento falido. Mas, ora, falido por quê? Como disse hoje para a minha amiga, concordo com ela que haja sim decisões ditas erradas. E essas nos levam a lugares sombrios.
Mas, depois que fazemos essas escolhas e já estamos nesses lugares, o que fazer então? Não dá pra voltar. A única coisa que dá pra fazer, é seguir em frente. Pensando melhor, espero, para não repetir as mesmas escolhas. Que sejam erros novos. Que seja diferente.

domingo, 19 de julho de 2015

Clarice

[...] Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria - e não o que é.[...]
Clarice, sempre Clarice. (Lispector, claro).

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Encontros e Desencontros

Me disseram para contar uma história. Então, de muitas que podem vir, vamos tentar primeiro com esta. Chovia há sete dias em Porto Alegre. Cidadezinha vazia, férias de julho, prédios desviando as gotas d'água que caíam do céu cinza chumbo. Depois de cair de um precipício emocional no final de semana, resolvi marcar um encontro. Sim. Eu, recentemente solteira de novo, resolvi me aventurar nesse mundo desconhecido dos solteiros, 'again'. Cinema. Fui rápida e certeira, ele aceitou imediatamente, como se estivesse do outro lado só esperando eu convidá-lo pra fazer algo. Quando ele disse rapidamente que sim, eu pensei, "uau, que fácil". Que fácil, que nada! Mas calma, que eu já estou me adiantando. 
A verdade é que eu já tinha encontrado esse rapaz, uma semana atrás, e tinha sido um bom encontro. Conversas interessantes, algumas risadas em meio a drinks, um beijo aqui, outro ali, e eu vim embora para casa satisfeita. E pensei, por que não repetir? Então fomos, deixei ele escolher o filme, o que já começou mal. Um filme teen. Mas no final das contas, não era tão ruim assim, me fez pensar. Era a história de um adolescente do tipo nerd, típico, daqueles "criados em apartamento pela vó" (metaforicamente), apaixonado pela vizinha: uma garota que adorava aventuras e se metia em mil confusões.  Mas no final do filme, para minha surpresa, um toque da vida real. A menina nunca se apaixonou por ele, ela estava imersa naquela vida de descobertas, da eterna descoberta de si mesma, e acredito que é mais fácil fugir de si mesmo viajando e ao mesmo tempo, tentando se encontrar, sem planos, sem pressa. Enquanto ele, estava ótimo no final do filme. Ele tentou, fez o que tinha que fazer, e senti um orgulho nos olhos dele de missão cumprida. Ele não ganhou a garota, porque, na verdade, não precisava. E eu me vi ali. Sim, estava no cinema com um cara boa pinta, bonitão, inteligente,  etc, etc, etc. Mas minha mente ficava voltando pro passado, eu simplesmente me via naquele garoto que descobria que a felicidade estava bem ali diante dele, na realidade, dentro dele, e que aquele sonho maluco de conquistar a menina rebelde, difícil e inalcançável era, sim, inalcançável. Mas ele não se sentiu fracassado, não era como se ele tivesse desistido, sabe? Ele estava em paz. E aquilo me tocou de um jeito. Me deu uma esperança absurda que eu também poderia ficar em paz. Porque eu tentei. Porque eu quis. Eu lutei. Fui forte por muitos anos. E aquilo, simplesmente, não era pra mim. Um ex meu costumava dizer que o pai dele sempre falava pra ele quando ele estava triste, "o que é teu está guardado". É mais ou menos por aí o que quero dizer. A felicidade está em nós, claro, ninguém vai nos dar algo que a gente já não tenha. Mas tanto o guri do filme como eu estávamos lutando por algo que nunca seria o que nós sonhávamos. E essa jornada é o oposto da felicidade.
Mas bem, voltando ao encontro, fiquei pensando na simplicidade que era ele gostar da minha companhia. Eu não tinha que me esforçar nem um pouco pra ele achar o máximo cada coisa que eu dizia (ou ele fingiu muito bem). E como a vida é engraçada, eu, ao contrário, bem... não estava tão confortável com as coisas que ele dizia. Mas a vida é assim mesmo, um eterno encontro e desencontro. E é preciso dizer adeus para certas coisas para poder dar boas vindas a outras.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

O quão difícil é fechar a porta pra uma paixão? Mesmo que ela nos mate, que ela sugue nossa energia de um jeito que nem achávamos que era possível? O quão difícil é deixar as coisas para trás?
Para mim, muito. É como se eu tivesse Phd em resgatar as coisas. Para quê deixá-las quietas, sem vida, enquanto podemos fazer uma bagunça naquilo que chamamos  de amor? Pois bem, eu chamo.
E essa fase da minha vida, permeada por alívios e dores, quase que ao mesmo tempo, tem me deixado confusa. Por um lado sigo com a pequena esperança, mas nem por isso menos forte, de que as coisas vão mudar, meu príncipe vai me reconquistar em seu lindo cavalo branco, seremos felizes como sempre imaginei que seríamos, porque eu mereço. Ou... eu me afasto desse sonho que provavelmente nunca se tornará realidade, vivo a minha vida em paz, procurou outros sonhos. Simples, não? Pois então, não. É como se o diabo viesse te tentar toda vez que tu vai fechar os olhos. Como se tu estivesse em abstinência de uma droga. Como se de repente, não houvera mais ar suficiente para respirar direito. Tu pensas em mil loucuras que se misturam e se embaralham na sua cabeça antes que tu consigas ao menos entender porquê está sendo tão difícil fechar essa porta. Qual o problema, sabe? O que te prende no passado? Eu não sei. Para mim, só sei que não tem sido fácil. É como se cada vez que falássemos, uma faísca de alegria surgisse que pudesse fazer com que a gente pulasse vários capítulos tristes e fosse direto pro final feliz dessa história. Eaí, às vezes, caio na real sem nem tentar. Penso que escrevi a maior parte da história sozinha e muitas vezes na solidão do meu quarto escuro e frio. E também penso que o tempo não vai mudar a maneira que ele se sente comigo, e a maneira que ele age comigo. Falar que ama é muito fácil. Mas eu nunca enxerguei realmente amor nas coisas que ele fazia. E no final das contas, sempre isso que pesou mais eu acho. Então, por que tão difícil me manter longe? Eu não sei. É como se houvesse um laço, um pacto absurdo que nos unisse em algo maluco. Não me resta nada além de deixar que o tempo me mostre meus erros e acertos, e que algum dia, eu entenda que isso não era nem perto de amor.

terça-feira, 21 de abril de 2015

E se?

Me transborda algo que já não sei identificar. Me abandonaste no meio da rua, no meio da tua vida, no meio do caos. Me abandonei a mim mesmo, por algo que me fez ser outrem. Minha imagem no espelho me confunde, são os mesmos traços, mas parece uma alma escurecida. Tenho cicatrizes, algumas fechadas, outras sangram. Tenho uma sensação de morte que não me deixa em paz. Vivo meus dias procurando algo que me parece que esqueci o que era. E as coisas vão perdendo um pouco a graça. Nunca soube realmente o que podia ser se sentir assim, traído. Já fui traída, encho uma mão. Mas pela primeira vez me senti traída. De fato, traída. Uma sensação de impotência, de desamparo, de luta perdida. Uma sensação do desconhecido, do estranhamento, da frieza dos fatos descobertos. Descobri uma sensação inteiramente nova. Me senti fraca, me senti um lixo, me senti nua. Como continuar amando? Como continuar oferecendo? Estou embriagada na minha própria ironia, no meu jeito esquisito de levar a vida, assim, sem pensar nas consequências. Apesar de que agora, o futuro me preocupa um tanto mais. Tenho medo e ao mesmo tempo sinto um pouco de prazer na dor de não perdoar. Seria uma vingança. É a única coisa que tenho. Às vezes cansa ser boa. Dizem que compreender é o melhor caminho, sempre. E se eu nunca mais te ver? Seria tão ruim assim? E se meus dias fossem de azul, pintados do infinito da cumplicidade com outros. E se eu deixasse tudo para trás, exatamente como está, meio assim, meio cinza, meio inacabado, sem traços. Eu sinto pena.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Prece

"Meu Deus me dê coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de tua presença. Me dê coragem de considerar esse vazio, como uma plenitude. Faça com que eu tenha coragem de te amar sem odiar tuas ofensas a minha alma e ao meu corpo... Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada, e mesmo assim, me sentir plena de tudo. Receba em teus braços o meu pecado de pensar."

Clarice Lispector, para celebrar ou apaziguar os sentimentos destas efemérides que se aproximam depressa.