sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Pequenas Sensações Cotidianas

Algumas sensações invadem nosso cotidiano de forma quase imperceptível mas, ao mesmo tempo, de um modo que alteram completamente o dia, o jeito de ver as coisas, as pessoas, de enxergar o mundo. Hoje tive que descrever uma das coisas que mais gosto no meu trabalho; percebi que, em todas as pessoas com quem convivo, gosto de coisas que não as mais óbvias. Gosto da risada de uma das minhas chefes: é leve, gostosa, parece uma gargalhada de criança, é um dos melhores sons para se ouvir durante o dia, forma quase uma melodia com os carros passando com seus motores rosnando em bom tom. Gosto do cheiro de esmalte que invade a sala quando outra delas sempre traz uma novidade para experimentarmos. Gosto do tom sereno como uma delas fala; gosto do rosto de saudade de quando uma conta dos seus sobrinhos e da irmã que mora longe. Gosto do barulho do salto alto em contraste com as teclas que digitam manhãs inteiras. Gosto do cheiro do café que perfuma a cozinha bem cedo, logo quando chegamos, e promove sempre o primeiro assunto do dia... "Quem vai querer café?". Gosto da voz nasalada e do jeito que lembra muito a minha dinda; gosto dos antúrios e os cactos que ficam perto das poltronas que pegam sol através das telhas de vidro. Gosto do cheiro do sabonete líquido, sempre o mesmo cheiro, sempre a lembrança da água gelada escorrendo pelos pulsos nos dois ou três minutos em que me tranco no banheiro quando o cansaço bate forte.
Saio do trabalho e experimento talvez a melhor sensação do dia quente no centro da cidade: sento durante um ou dois minutos na beira do lago com um chafariz, no meio da praça, no meio do centro, no meio de tudo, fecho os olhos e deixo que a água seja borrifada lentamente pelo vento nas minhas costas, no meu rosto, nos meus braços meio ardidos pelo caminho pouco protegido do sol do meio-dia. Chego em casa e gosto de tirar os sapatos, gosto de sentir o piso frio da casa fechada; corro para a cozinha, ouço o ranger das portas do armário meio velho, abro a geladeira sem procurar nada específico, é pelo puro prazer do gelado nos pés com o gelado no corpo. Deito no sofá, nada mais delicioso do que um sofá gordinho de almofadas para nos recepcionar depois de uma manhã trabalhada e o início de uma tarde preguiçosa.
Gosto de encontrar o meu bem, me esperando em casa, cheiro sua pele e desvendo nos seus dedos tudo o que tocou durante o tempo que estive ausente. Meio maluco, mas gosto das impressões que o olfato nos permite, dos registros que as mãos fazem, muitas vezes apenas pela delícia de tocar. Gosto do jeito como ele segura a aliança, firmando o polegar por baixo, fazendo o anel saltar por cima do dedo marcado de compromisso. Gosto das golas das camisas, sempre esgaçadas (ou seria esgarçadas?, não sei) e com um cheiro inconfundível. Gosto da barba por fazer, do barulho que as unhas fazem ao percorrê-la. O cheiro da comida. 
Descrevo minha rotina sob outra perspectiva, meu cotidiano com outros olhos.
Descubro o novo no velho, o prazer na rotina, o amor na simplicidade de um abraço no último gesto da noite. Teus braços, sempre me esperando abertos para que eu possa dormir tranquila. Lá se conjugam o riso, o banho de chafariz, o perfume, o cheiro, a unha, a barba, o esmalte, o café, o gelado, os estalares, a doçura, o açúcar, o afeto.
E encontro, em cada dia, uma nova delícia diante dos mesmos verdes olhos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário