segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Com carinho, fulano

Mais do que uma questão de respeito e bom senso, deveria ser proibido ler as dedicatórias dos livros dos outros. Desrespeito a isso deveria ser caso de polícia. De pedir indenização por danos morais. Prisão perpétua. Pena de morte. As dedicatórias são as poucas linhas de muitos sentimentos que não foram escritos, são sentimentos exteriorizados com uma assinatura, sigla ou letra indecifrável que deveria ser inacessível a um terceiro. Dedicatórias são as cartas que não foram enviadas, os "eu te amo" silenciados, as piadas íntimas. Invadir a dedicatória do outro é mais grave do que violar a sua nudez mais pudica.
Certa vez não resisti à curiosidade de uma letra num fundo vermelho. Foi caso de prisão perpétua, caso de morte: para mim. Morri de ciúmes, nas entrelinhas daquelas palavras rabiscadas e das palavras sem sentido senão para aquele a quem elas foram endereçadas, se confessavam sentimentos e intenções e se escondia o remetente dos terceiros curiosos através de uma assinatura ininteligível; morro na minha prisão perpétua, ao relembrar aleatoriamente daquele papel grosso e vermelho riscado com força, na demonstração de uma vontade que eu nunca compreenderei bem qual era. Confessei meu crime e fui absolvida. Ouvi uma história, o presente, o contexto, o remetente, a assinatura. Mas de (quase) nada adiantou. A memória de invadir algo que não deveria ter feito, encontrar algo que não queria ter visto e aquela assinatura com um ponto perfurando o papel cartão, mesmo que não significasse mais nada, para mim era uma assombração de uma derrota perante eu mesma.
Hoje fujo das dedicatórias alheias.
E, só para constar, não empresto livros com dedicatórias. Já dizia a minha vó: curiosidade mata.
Minhas dedicatórias são o secreto da minha biografia.

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