domingo, 24 de março de 2013

Histórias para Helena

Três meses de jejum e escrevo mentalmente todos os dias para ela, Helena. Escrevo para o dia em que se tornar adolescente, para o dia que quiser marcar a pele com fatos inesquecíveis, para aqueles dias onde a felicidade dominar de forma explosiva ou para aqueles onde o fim da tristeza não for visível a olho nu. Para que ela saiba que todos temos os mesmos dramas, mas que mesmo assim os seus serão únicos, que serão ouvidos por uma amiga compreensiva.
Sonho com o dia em que me perguntará sobre meus namorados. Com os dias que fará as contas sobre o tempo do meu casamento e sua idade e que constatará que, mesmo tão jovens, não casamos grávidos e que ela foi uma linda consequência do amor que nos transbordou desde o primeiro momento. Imagino as histórias, direi os nomes, os endereços se os souber, permitirei que conheça o meu passado, minha vida, meus amores, minhas desilusões, desnudar minha alma perante esse ser frágil que me conheceu desde seu primeiro instante de vida e que me gerou mãe. Nós vamos encolhendo diante dos filhos, meu bem. A grandeza da sua inocência, as roupas que deixam de servir rápido e as lições diárias de amor e compreensão fazem com que nos tornemos todos os dias um pouco menores ao lado desses gigantes, os filhos. Sonho com o dia em que eu dormirei no seu colo. Que ela será meu primeiro e último refúgio de intimidade e carinho, que ela foi e sempre será minha grande amiga.
Penso em imprimir páginas desse blog adolescente, em dar-lhe um punhado dos meus sofrimentos para que ela os conheça, para que pergunte quem os causou, para que saiba que também fiz alguém sofrer. Não penso em mudar a história, não cogito ser a mãe puritana. Quando chegar o tempo, ela saberá de tudo que quiser saber, sem mentiras, sem omissões, sem culpas. Direi a ela que o melhor gosto do passado fica com aquelas pessoas que nunca imaginamos que seriam tão marcantes. Contarei tudo porque acho linda a cumplicidade que pais e filhos podem ter quando se empenham em uma relação baseada na confiança e na verdade e porque queria muito ter tido essa relação quando foi a minha vez. É sempre a nossa vez.

Registro os fatos, tento relembrá-los da forma mais verídica para que a poeira das memórias não me faça cometer injustiças ao contar essas histórias. Talvez seja por isso que vivo revisitando as mesmas velhas memórias, para que estejam sempre frescas, os odores, os lugares, como um livro que tiramos da estante para arejar suas páginas. 
Enquanto esse dia não chega, é hora de juntar os brinquedos espalhados pelo chão e arrumar a mochila para a escolinha amanhã.

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